NOTA DE REPÚDIO
O Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre (CMS/POA), órgão permanente e deliberativo do SUS, no uso das atribuições que lhe conferem a Constituição Federal, Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990; pela Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, e a Lei Complementar Nº 277 de 1992, considerando que:
1. Na primeira semana de novembro, o secretário de Saúde de Porto Alegre Mauro Sparta publicou em sua rede social duas fotos de seu encontro com o deputado federal Bibo Nunes (PL-RS) com a informação “Nessa semana estivemos reunidos com o deputado federal Bibo Nunes. Em pauta, ações e medidas para qualificar a saúde de Porto Alegre”;
2. O referido parlamentar foi protagonista de uma barbárie, de um dos mais tristes episódios que incitam a violência e o ódio no país. Publicou um vídeo gravado no dia 9 de outubro, no qual agride e ameaça estudantes das universidades federais de Pelotas (UFPel) e Santa Maria (UFSM) que protestaram contra bloqueios na educação feitos pelo governo federal, dizendo, pasme-se, entre inúmeras outras agressões, que os manifestantes merecem ser “queimados vivos”, chamando-os de “escória do mundo” e “parasitas”;
3. A violenta declaração do deputado não causou revolta apenas em Santa Maria, a cidade da tragédia da boate Kiss, e na UFSM, mas em todo o país. No incêndio da boate Kiss, no dia 27 de janeiro de 2013, em Santa Maria, morreram 242 pessoas, muitos alunos da Universidade;
5. A Defensoria Pública da União (DPU) ingressou com uma ação civil pública na Justiça Federal contra o deputado Bibo Nunes. Na ação, segundo notícia do site G1, o defensor regional de Direitos Humanos no RS Daniel Mourgues Cogoy declara:
"A ação do réu causou um dano que não se restringe ao patrimônio individual de cada prejudicado. Ela atingiu o âmago da dignidade humana, atentando contra a premissas e objetivos fundantes do Estado Democrático de Direito [...]. O dano constatado transcende o interesse dos indivíduos prejudicados e atinge a sociedade como um todo, uma vez que atinge os próprios fundamentos e objetivos da comunidade política brasileira"
6. O Ministério Público Federal (MPF) instaurou um procedimento para averiguar a manifestação;
7. Nos recordamos até o hoje o esforço coletivo que foi, para o SUS e para a sociedade civil em todo o Estado do Rio Grande do Sul, atender estes jovens nas urgências e emergências, e acolher o triste e desesperador sofrimento dos familiares e amigos;
8. Em 2001, o Brasil, devido aos elevados índices de morbimortalidade por acidentes e violências, promulgou a Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências (PNRMAV), por meio da Portaria nº 737, do Ministério da Saúde. A qual, inclui, na agenda de saúde, estratégias para vencer a violência e promover a Saúde e a cultura da paz. Em 2006, foi implantado pelo Ministério da Saúde, o Viva/Sinan Vigilância de Violências e Acidentes, com o objetivo de que a violência seja investigada e mapeada epidemiológicamente. Segundo o VIVA: “Os impactos das causas externas (violências e acidentes) na qualidade de vida e nas condições de saúde da população representa um grande problema a ser enfrentado em todo o mundo”.
9. Conforme os dados da Biblioteca Virtual da Atenção Primária à Saúde (BVAPS) da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre, no ano de 2021 a principal causa de morte na faixa etária tanto de 15 a 19 anos, como de 20 a 39 anos, foi por causas externas (homicídio). Morreram, em Porto Alegre, 237 pessoas jovens vítimas de homicídio;
10. A Lei nº 8.069 (Estatuto da Criança e do Adolescente), de 13 de julho de 1990, em seu artigo 13, determina que todo caso suspeito ou confirmado de violência contra crianças e adolescentes é de notificação obrigatória (Notificação de violências e maus-tratos contra crianças e adolescente); já o artigo 16 preserva o direto à liberdade e compreende entre outros aspectos, no inciso II, a opinião e expressão; por fim, o artigo 18 diz que é dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor;
11. Como gestor do Sistema Único de Saúde de Porto Alegre, é incontestável que o secretário de Saúde Mauro Sparta deveria ter se posicionado CONTRÁRIO E COM REPUDIO às manifestações de violência e de ameaça à vida dos estudantes feitas pelo deputado Bibo Nunes. INFELIZMENTE não foi o que fez e nem o que vimos nas redes. O que vimos foi a INSTITUCIONALIZAÇÃO da violência;
Por tudo isso, manifestamos o nosso absoluto REPÚDIO contra a atitude do secretário de SAÚDE Mauro Sparta frente a este brutal ato de violência praticado pelo deputado Bibo Nunes aos estudantes. Reafirmamos que estamos atentos e vigilantes a toda e qualquer violação de direitos humanos, especialmente em relação aos posicionamentos de figuras públicas e que ocupam papeis de destaque e de representatividade do SUS.
Porto Alegre, novembro de 2022.
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