Nota pública do CMS sobre a extinção do IMESF

O Conselho Municipal de Saúde, órgão permanente e deliberativo do Sistema Único de Saúde, vem a público se solidarizar com os trabalhadores do IMESF e com a população de Porto Alegre. Especialmente as comunidades localizadas nos territórios mais vulneráveis, que além das dificuldades cotidianas ocasionadas pela precariedade de serviços públicos ofertados, como transporte, educação e assistência social, se depara  mais uma vez com a notícia de desassistência causada por mais uma crise na  gestão  da saúde na cidade.

Desde a década de 90, o CMS vem discutindo e alertando a gestão municipal em relação à necessidade de estabelecer quadro efetivo para a Atenção Básica. Com remuneração e demais condições de trabalho que permitam fixar as equipes de saúde da família nas comunidades, integração das equipes, humanização do trabalho em saúde e proporcionando estabilidade. Desse modo, estabelecendo vínculo entre as equipes e as comunidades onde atuam, garantindo que a Atenção Básica seja efetivamente a principal porta de entrada do Sistema de Saúde.

Em 2008, o CMS deliberou, através da resolução 37, que:

a) A estratégia de Saúde da Família seja adotada como modelo de Atenção Básica em Porto Alegre;
b) Toda unidade ou serviço de Saúde, no âmbito da Atenção Básica, que venha a ser implantado no município, deve adotar a Estratégia de Saúde da Família;
c) O município de Porto Alegre, através da Secretaria Municipal de Saúde, crie as condições estruturais necessárias para que as equipes de saúde da família tenham vínculos regulares de trabalho, na forma de servidores estatutários, vetando-se a forma de contratos terceirizados por cooperativas, ONGs e OSCIPs;
d) A remuneração dos trabalhadores das Equipes de Saúde da Família garanta condições dignas de trabalho, permitindo a fixação dos trabalhadores nas comunidades, reduzindo a rotatividade dos profissionais nas equipes;
e) Seja implementada a transformação gradativa das Unidades Básicas de Saúde que atuam no modelo tradicional, para a Estratégia de Saúde da Família, estabelecendo através de legislação específica, a migração dos trabalhadores para a estrutura organizacional a ser instituída.

No mesmo ano, o CMS entregou aos órgãos de controle uma denúncia que identificou indícios de irregularidades na atuação do instituto Sollus, OSCIP contratada pela gestão municipal para administrar a saúde da família no município. Em 2010, a denúncia foi confirmada através da operação Pathos deflagrada pelo Ministério Público e Polícia Federal que apontou o desvio de 9 milhões. A gestão municipal rompeu contrato com a Sollus e transferiu à Fundação Instituto de Cardiologia, onde também o CMS identificou impropriedades que foram encaminhadas para verificação das autoridades competentes. Em 2007, a PMPA comprometeu-se, através de assinatura de termo de ajuizamento de conduta proposto pelo MPE, MPF e MPT, a abster-se de contratar profissionais para a atenção básica sem realizar concurso ou seleção pública, assim como a enviar projeto de lei à câmara municipal prevendo a admissão dos profissionais necessários à Atenção Básica de saúde no município, de modo direto, via processo público (concurso ou seleção). O TAC estabelecia o mês de março de 2008 para tais compromissos. Apenas no ano de 2010 a SMS encaminhou a proposta de criação do IMESF ao CMS, que rejeitou o projeto. Mesmo assim, este mesmo projeto foi aprovado pela Câmara Municipal de Porto Alegre. Na sequência, as entidades que majoritariamente compõe o CMS ingressaram com Ação Direta de Inconstitucionalidade que foi julgada pelo TJ/RS em 2011, e, no dia 12/09/19, pelo STF.

É bastante preocupante a atitude do prefeito de Porto Alegre que se desresponsabiliza pela gestão da saúde ao confundir a população com afirmações imprecisas. A SMS e a PMPA têm conhecimento prévio da ilegalidade do IMESF, o CMS é ativo e atento às necessidades da cidade, e as deliberações da Conferência Municipal de Saúde de Porto Alegre, realizada em abril de 2019, apontam nesse sentido:

a) Ampliar, qualificar e fortalecer a Atenção Primária à Saúde e a cobertura de Estratégia de Saúde da família em todos os seus componentes (Saúde bucal, NASF, centro de convivência e cultura, consultório de rua, saúde da família e academias de saúde) com equipes completas, considerando o dimensionamento de pessoal, respeitando o trabalho dos agentes comunitários de saúde e ampliando o número de profissionais de acordo as necessidades de saúde do território;
b) Constituir carreira pública nacional para o Sistema Único de Saúde (SUS) a todos profissionais e garantia de implementação e fixação na rede de atenção própria e pública, bem como, implementação de uma política de educação permanente para qualificação do sistema de saúde;
c) Garantir o financiamento público com prioridade para a execução de serviços prestados diretamente pelo poder público e suspender as iniciativas de terceirização, contratualização das organizações sociais e parcerias público-privadas, que rompem com os princípios do SUS universal e público, respeitando a ordem constitucional que restringe a participação da iniciativa privada no SUS ao caráter exclusivamente complementar.

Até o presente momento, a atual gestão da SMS não apresentou ao CMS a política de atenção básica, considerando que o Plano Municipal de Saúde foi aprovado sob essa condição. Agora, diante de mais uma crise, o que temos é mais do mesmo, demissões dos trabalhadores com promessas que sequer foram apresentadas ao CMS, como prevê a legislação do SUS. E, também, como confirmado em decisão em sentença judicial proferida pelo TRF4 que determinou à prefeitura de Porto Alegre que inclua o CMS nas deliberações do município sobre novos contratos, convênios e projetos que possa vir a ajustar no âmbito do SUS. Esta sentença não é cumprida pelo secretário de saúde e pelo prefeito, tampouco são responsabilizados por não cumprir, pois não há interesse em ouvir a sociedade mesmo  contrariando a constituição brasileira e a lei orgânica do município.

O CMS tem o dever de alertar a sociedade sobre os riscos de desassistência com o caos e o terror que especialmente as comunidades mais vulneráveis estão vivenciando  com ações que contribuem para a precarização da saúde pública através da terceirização, ofertas de contratos frágeis que podem gerar irregularidades e impropriedades, já apontadas por este colegiado.

O CMS de Porto Alegre reafirma sua disposição de defesa do Sistema Único de Saúde público e de qualidade. Somente através da gestão direta é possível garantir a continuidade das políticas públicas. Não é aceitável que se repitam velhas práticas e com os mesmos equívocos maquiados de novidade ou modernidade. O tempo tem demonstrado que os remendos sempre falham. Por nenhum serviço de saúde a menos em Porto Alegre!

Porto Alegre, 18 de setembro de 2019.
Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre.


  

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