Em alusão ao Mês da Consciência Negra, o plenário do Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre (CMS/POA) pautou a saúde da população negra e estratégias para o fortalecimento do Conselho e do SUS antirracistas. Com caráter formativo, o debate integrou as atividades preparatórias para a 9ª Conferência Municipal de Saúde de Porto Alegre (9ª CMSdePOA), que acontecerá nos dias 23, 24 e 25 de março de 2023, data deliberada pelos conselheiros e conselheiras de Saúde.
A professora de geografia da UFRGS, Cláudia Pires, e o representante da Frente Quilombola RS, Onir Araújo, apresentaram o Atlas da Presença Quilombola em Porto Alegre/RS, trabalho desenvolvido de forma colaborativa pelo Núcleo de Estudos Geografia e Ambiente (NEGA/UFRGS) e pelos movimentos sociais junto às comunidades quilombolas da capital gaúcha. (Documentário Atlas)
Segundo a professora, a cidade conta com 11 territórios autodeclarados quilombolas, com a presença do primeiro quilombo urbano do país titulado, o quilombo da família Silva, que abriu uma frente pioneira de discussão, de luta e resistência para a história do país. Para Cláudia, é urgente o debate sobre o direito territorial, à regularização fundiária, à saúde, à educação e à titulação. “O debate que presenciamos tem que ser cotidiano e assumido por todos nós, inclusive a partir da condição da “branquitude”, de pensar como aciono os meus sistemas para entender esse processo desigual e racial estruturado no nosso país”, destacou.
Para Araújo, é preciso enfrentar esses gargalos que colocam em risco a vida do povo quilombola. “O problema é seríssimo, com impactos devastadores para os territórios do povo quilombola, que são sujeitos de direitos na cidade”, falou Araújo. Para ele, o genocídio não é somente físico, mas também ideológico, na medida que se abandonam os referenciais ancestrais de pertencimento e cosmovisão. Araújo destacou a importância da representatividade dos quilombolas e indígenas nos espaços de discussão da sociedade. “Nós queremos que o nosso povo reencontre seu ritmo, que vem perdendo a cada dia. A nossa libertação vai ser coletiva ou não vai ser”, salientou, o representante quilombola.
“A gente se sente muitas vezes impotente diante de tantas atrocidades que temos sofrido, mas nunca deixamos de lutar”, manifestou o cacique Odirlei Fidelis, etnia Kaingang, da aldeia Vãnka, no Lami, que também integrou a mesa do debate. Fidelis fez denúncia sobre o uso da Cloroquina como experiência dos governos nas comunidades indígenas. “Em plena pandemia, muita comunidades indígenas foram usadas como experiência para a Cloroquina. Fomos usados como manobras políticas e cobaias por ideologias de governantes”, denunciou, apontando que as instituições que deveriam defender as comunidades indígenas foram aparelhadas a serviço do governo.
O cacique falou, também, sobre o adoecimento em saúde mental e pediu ao CMS que fiscalize os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) de Porto Alegre. “A nossa saúde mental está passando por uma situação muito ruim, o que é uma coisa nova para nós indígenas. Todo dia somos ameaçados de extermínio, invasão dos territórios, estupro, tanta desgraça que estamos ficando doentes mentalmente”, desabafou Fidelis.
Presente na reunião, o conselheiro Alberto Terres, representante da CUT/RS, registrou a relevância de se encaminhar, no Mês da Consciência Negra, a acusação de racismo feita ao plenário do Colegiado no dia 22 de julho, pelo representante da gestão, conselheiro Francisco Isaias. Terres cobrou o encaminhamento do assunto e lembrou que ainda não foi enviado ao CMS o boletim de ocorrência (BO) da denúncia. O conselheiro registrou a história do CMS na luta contra o racismo e salientou que esta situação precisa ser encaminhada. “Infelizmente até hoje o representante do governo Melo não apresentou esse boletim, mas jogou nas redes chamando este plenário de racista", disse Terres. O CMS emitiu, naquele período, uma nota de elucidação do assunto.
Durante a plenária, também foram aprovados dois pareceres da Comissão de Saúde da População Negra (CSPN) do CMS/POA, um sobre o projeto “Promoção da Equidade nos registros dos Sistemas de Informação de Saúde: Qualificação dos Cadastros Individuais de Pessoas das Populações Específicas”, e outro sobre os recursos da portaria SES nº 635 de gosto de 2021, que define os critérios de habilitação e a forma de distribuição do recurso financeiro do Programa Estadual de Incentivos para a Atenção Primária à Saúde (PIAPS).
Também foi aprovada uma nota de posicionamento da CSPN que pede que a Secretaria Municipal de Saúde de prosseguimento aos encaminhamentos que constam no Relatório Final do Grupo de Trabalho sobre Racismo, de 2016. Os documentos foram apresentados pelas conselheiras
A atividade contou com uma mística de abertura com o mestre Paulo Romeu, coordenador do Instituto Sociocultural Afro-Sul Odomode. A reunião foi transmitida ao vivo e está disponível no canal do facebook do CMS.