Conselheiros de Saúde da capital votaram pela suspensão do projeto da Prefeitura de adquirir novo empréstimo junto ao BRDE para a construção e mudança de local do Hospital Materno Infantil Presidente Vargas (HMIPV)

08.07.2024

 
(Fotos banco de imagem: Cristine Rochol/PMPA)
 
Único hospital municipal especializado em maternidade e infância com estrutura 100% pública, de excelência e qualidade está ameaçado de terceirização total. Na noite de quinta-feira, 04, os conselheiros de Saúde, que representam o controle social do Sistem Único de Saúde (SUS), aprovaram uma série de medidas para suspender o andamento do projeto do governo Sebastião Melo.

(Foto banco de imagem UTI Neonatal HMIPV: Cristine Rochol/PMPA)

08.07.2024
 
Entre as medidas, o Conselho Municipal de Saúde (CMS/POA) encaminhará aos órgãos de controle externo a solicitação para suspender a execução do andamento do Projeto de Lei Municipal nº 015/2024 - que autoriza o poder executivo a contratar operação de crédito com o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo SUL (BRDE), até o valor de R$ 300 milhões destinado a construção do novo prédio para o HMIPV. Também a suspensão dos efeitos administrativos decorrentes do Projeto de Lei no âmbito do SUS Municipal. Na tarde desta terça-feira, 9, já ocorre a reunião da coordenação do Colegiado com o Ministério Público Federal (MPF).
 
O CMS também informará aos órgãos de controle sobre o descumprimento, por parte do Município, da decisão judicial de 2017, processo 5004915-44.2013.4.04.7100, que determina à Prefeitura de Porto Alegre que inclua previamente o CMS nas deliberações do município sobre novos contratos, convênios e projetos que venha a incidir no âmbito do SUS municipal.
 
O Conselho cobrará, ainda, por via administrativa, do secretário de Saúde Fernando Ritter, a justificativa com estudo técnico que comprove a aplicação dos princípios de razoabilidade, proporcionalidade e economicidade da mudança e construção do Hospital. Além de que a gestão municipal garanta o envio e acesso a todos os processos administrativos atinentes ao projeto de construção do novo HMIPV.
 
Para o controle social do SUS, que lutou pela conquista do Presidente Vargas, é preciso que o governo apresente uma análise técnica que comprove a necessidade para a saúde pública de Porto Alegre de contratar empréstimo para a construção de uma nova sede para o Hospital. Além disso, que o estudo apresente os motivos que levaram o Município a querer repassar o Hospital para um “Parceiro Público Privado”. Caso contrário, o governo Melo evidencia que pretende apenas dar seguimento a um projeto neoliberal de terceirização irrestrita dos serviços e de entrega dos equipamentos públicos para a iniciativa privada, se exonerando cada vez mais da responsabilidade sanitária com a cidade.
 
Retrospectiva
 
O governo de Sebastião Melo, através do Conselho Gestor de Parcerias (CGP), desde 2021, autorizou a concessão para o Hospital. A decisão explicitou, à época, a intencionalidade de repassar o serviço à iniciativa privada. Em setembro do mesmo ano, o Conselho Municipal de Saúde reprovou a intencionalidade da concessão e questionou publicamente a legalidade do ato administrativo.
 
O gestor descumpriu, nesta situação, todas as normativas legais previstas e obstruiu, assim, o pleno exercício das atribuições do controle social no âmbito do SUS municipal, na medida que não encaminhou os projetos para análise e discussão prévias do CMS e tão pouco respeitou as decisões dos conselheiros de Saúde sobre o equipamento público. Nas plenárias realizadas sobre o tema, as Secretarias Municipais de Saúde (SMS) e de Parcerias não apresentaram o escopo do termo de estudo previsto, nem os critérios para a manifestação de interesse, ferindo os princípios da administração pública.
 
Municipalização do HMIPV
 
É importante destacar que o CMS tem cumprido seu papel, fazendo a defesa intransigente do SUS ao longo de seus quase 30 anos, e, com suas ações, tem conquistado mais e melhores serviços públicos de saúde para a população. Exemplo disso é o próprio HMIPV, cujo processo de municipalização (livro 20 anos do controle social de POA) foi garantido pela participação popular e resultado de deliberação da 1ª Conferência Municipal de Saúde de Porto Alegre. 
 
No termo de municipalização do Presidente Vargas, assinado em 2000, está previsto o repasse de recursos federais em pecúnia para cada servidor federal que deixasse de compor o quadro do hospital. Como esse repasse nunca ocorreu, o CMS exigiu do gestor a cobrança da dívida, assim como representou ao Ministério Público Federal o pedido que acionasse a Prefeitura para providenciar a cobrança dos recursos, equivalentes a mais de R$ 320 milhões. Com esta ação, em 2022, houve o ingresso de R$ 45 milhões no Fundo Municipal de Saúde (FMS), pagos pelo governo Federal para o abatimento da dívida alusiva à municipalização do Hospital. 
 
Suplementação de recursos da Saúde para a Secretaria de Educação
 
Em julho de 2022, em plenária, o CMS recebeu a denúncia de que a Prefeitura utilizou parte deste recurso como fonte de suplementação para a Secretaria de Educação. De acordo com o processo SEI (22.0.000033311-9), os recursos financeiros suplementados por decretos somaram a quantia de R$ 29.489.531,79. Conforme a Lei Federal nº 141/2012, os recursos da Saúde devem ser gerenciados pelo FMS, com a análise e aprovação do CMS/POA.

Inclusive, há sentença judicial expedida pela desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ/RS), Maria Isabel de Azevedo Souza, de junho de 2018, que determina à SMS a gestão do FMS, contudo, tem sido descumprida sistematicamente, como neste caso.

Projeto para Novo Hospital
 
O  CMS teve conhecimento do projeto através de notícia na mídia, em fevereiro de 2024, quando a Prefeitura divulgou o plano do novo hospital, que pretende seja construído na avenida Érico Veríssimo nº 100, o modelo de terceirização que será estabelecido, e a proposta de investimento financeiro. “O município deverá aplicar R$ 300 milhões até 2026, por meio de financiamento junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, na construção do prédio e na compra de equipamentos. O aporte inicial do parceiro privado será de R$ 148 milhões. O investimento privado será pago pelo poder concedente dentro da contraprestação mensal, que neste caso é composta pelo custo operacional (opex) mais o pagamento do financiamento, totalizando R$ 10,2 milhões. O Investimento total, em 20 anos, será de R$ 605 milhões”, conforme notícia publicada pelo Município.
 
O CMS tem o dever de informar e alertar a população de Porto Alegre do risco de desassistência provocado pelas ações de repasse dos serviços de saúde para iniciativa privada contrariando as deliberações do Conselho de Saúde e das Conferências. Sobretudo, porque tais mecanismos acabam contribuindo para a desresponsabilização dos gestores públicos de suas atribuições, que tem caráter constitucional.

Também chama atenção o investimento de recursos financeiros volumosos no projeto de construção do novo prédio onde o hospital seria instalado. Levando em conta o atual cenário de emergência em saúde, após a situação de calamidade pública, existem demandas prioritárias como o investimento na Rede de Atenção Básica e na Rede de Atenção Psicossocial, que foram as prioridades deliberadas na Conferência de Saúde de 2023.
 
Participação popular no SUS

O Art.196 da Constituição Federal estabelece a saúde como direito de todos e dever do Estado, e o Art. 198 define que as ações e serviços de saúde devem se organizar de forma descentralizada, integral e com participação da comunidade. A participação da comunidade se efetiva no SUS através das Conferências e Conselhos de Saúde.

Portanto, a realização de  consultas públicas e audiência pública como fez o governo não exime do cumprimento do respeito à instância máxima de deliberação do SUS no âmbito do município. 
 
Deliberações das Conferências de Saúde
 
Cabe salientar, que o governo não cumpre, com este projeto e com as demais terceirizações na Saúde, as deliberações votadas pela sociedade nas Conferências Municipais.

Na 8ª Conferência Municipal de Saúde a segunda proposta mais votada foi: “Garantir o financiamento público com prioridade para a execução de serviços prestados diretamente pelo poder público e suspender as iniciativas de terceirização, contratualização das organizações sociais e parcerias público-privadas, que rompem com os princípios do SUS universal e público, respeitando a ordem constitucional que restringe a participação da iniciativa privada no SUS ao caráter exclusivamente complementar.”

Na última Conferência de Saúde, a 9ª, entre as deliberações figurou o "fim das terceirizações e privatizações no SUS como mecanismo para a garantia do comando único na gestão do SUS para a efetivação dos princípios de universalidade, integralidade e equidade, por meio de contratação de servidoras/es públicos, com relação de trabalho estável, possibilitando condições para a construção de vínculos de atenção e cuidado com a comunidade, fundamental para a efetividade do Controle Social". 


  

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