Prestação de Contas do Programa Agiliza foi reprovada pelo Conselho de Saúde
Foto Katia Camargo/CMSPOA
03.10.2024
Os conselheiros de Saúde expressaram sua decepção com a execução de menos de 45% dos recursos divulgados para o Agiliza Saúde que foi lançado, em agosto de 2023, pela Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre (SMS/POA) para reduzir filas de espera das especialidades para consultas, exames e cirurgias.
A utilização de apenas R$9.076.363,82 para o componente assistencial (oferta de exames e consultas) frente aos R$14.796.084,00 no componente de infraestrutura (equipamentos) em locais que não tem relação direta com as filas foi um desapontamento para os conselheiros. Também o fato do Programa que foi criado através de Decreto para ser executado no ano de 2023, ter para ser executado em 2024 somente os valores empenhados no exercício anterior.
A votação foi realizada na
plenária de quinta-feira, 3 de outubro, após análise técnica feita pela
Comissão de Orçamento e Financiamento (COFIN) do
Conselho Municipal de Saúde (CMS/POA), que demonstrou a falta de impacto do Agiliza Saúde nas filas de especialidades.
Inconsistência e discrepância de valores nas fontes oficiais
Na implantação do Programa, em agosto de 2023, quando o projeto foi apresentado ao CMS, os recursos iniciais, informados pelo próprio secretário de Saúde Fernando Ritter, eram de R$55,6 milhões, sendo R$14 milhões para reduzir fila de espera para especialidades, R$28,5 milhões para compra de equipamentos para hospitais próprios e SAMU, e R$13,1 milhões para a construção e reforma de unidades de saúde (US).
No Relatório Anual de Gestão (RAG/SMS) de 2023, os recursos para o programa divulgados eram de R$61.556.671,00 (disponíveis) e R$53.151.854,00 (aprovados). Destes, R$3.072.784,00 foram utilizados para reduzir fila de espera exames e cirurgias, R$989.804,00 para compra de equipamentos para hospitais próprios e SAMU, e R$19.975,00 para construção e reforma de US. Já no 1ª quadrimestre de 2024. O RAG apresentou os mesmos valores de 2023 no total geral disponível (R$61.556.671,16) e construção e reforma de US (R$19.975). No entanto, no mesmo quadrimestre de 2024, foram utilizados para a redução de filas, R$9.492.133,71, e para compra de equipamentos para hospitais próprios e SAMU, R$9.538.158,88.
No RAG 2º quadrimestre de 2024, manteve-se os R$ 9.492.133,71 para redução de filas, ampliando para R$ 14.796.084,04 o valor para compra de equipamentos para hospitais próprios e SAMU, e R$ 271.368,00 para construção e reforma de USs, sendo desse montante R$19.975,00, estranhamente, destinados a capacitação para APS.
Baixo percentual executado tendo em vista a necessidade emergencial das filas de espera
Um ano depois de sua implantação, o total geral executado para o Agiliza foi de R$24.143.815,86, um percentual de 39,22% com relação ao valor disponibilizado (R$61.556.671,00) e de 45,42%, em relação ao valor aprovado (R$53.151.854,00).
A Cofin também chamou a atenção para a baixa efetiva das instituições prestadoras utilizadas para exames e consultas. Conforme informação solicitada pela Cofin ao Fundo Municipal de Saúde (FMS), foi executado o valor total de R$9.076.363,82, perfazendo um percentual de 64,83% em relação ao valor disponibilizado. Cabe ressaltar aqui, que os valores apresentados no RAG foram diferentes dos apresentados pelo FMS. No RAG consta o valor de R$9.492.133,71.
A conselheira Maria Letícia de Oliveira Garcia, que apresentou a análise da Cofin, perguntou às representantes da gestão no plenário, Vânia Frantz e Fernanda Fernandes, sobre os prestadores que não receberam recursos do Agiliza por não atingirem as metas do contrato já existente. As gestoras não responderam ao questionamento, assim como sobre os dos débitos pretéritos de valores que deveriam ser quitados por alguns prestadores para poderem participar do Programa.
Para o Conselho, o Agiliza, criado com a promessa de reduzir filas de espera para consultas, exames e cirurgias, teve uma execução assistencial baixa e foi muito inferior, até o momento, à sua proposta inicial projetada pela SMS.
Em agosto de 2023, em
notícia que divulgava o lançamento do Programa, o secretário municipal de Saúde, Fernando Ritter, afirmou que a SMS estava “prevendo uma redução de 81% nas filas de espera” com foco em algumas especialidades como oftalmologia adulta e pediátrica, ressonâncias, cirurgias de pequeno porte, dermatologia e urologia.
O CMS comparou algumas filas de espera da época com agosto de 2024 (um ano depois). Para consulta médica de oftalmologia geral adulto, em agosto de 2023 a fila de espera era de 10.555 com efetividade de 0,77, em agosto de 2024, a fila aumentou para 26.917 pessoas aguardando, com piora na efetividade para 0,41. A situação não é diferente na fila para consulta médica com dermatologista geral, que em agosto de 2023 contava com 4.986 pessoas na fila, com efetividade de 1,17, e, em 2024, 3.977 pessoas aguardavam na fila, tendo a efetividade piorado para 0,70. A efetividade abaixo de 1 indica que não existe equilíbrio entre a oferta e a demanda, há um déficit, ou seja, a SMS oferta menos consultas ou exames do que a necessidade e demanda da população.
Já para exames, o quadro também não melhora. Para fazer uma ressonância magnética, em 2023, 1.473 pessoas aguardavam na fila, e, em 2024, a fila era exatamente a mesma, 1.473 pessoas. Dos exames ofertados pela SMS e disponibilizados no portal de
transparência em 2023, 23 exames eram apontados com efetividade abaixo de 1, em 2024 o número aumentou para 29. No total, em 2023, 84.921 esperavam na fila, no mesmo período a fila aumentou para 127.329 pessoas, um aumento de praticamente 50% de pessoas aguardando para fazerem exames.
Os Conselheiros expressaram seu descontentamento durante a plenária em manifestações que expuseram não só a manutenção como o aumento das filas para especialidades tanto nas consultas como para exames.
Everton Cristino Pires, usuário do SUS e Conselheiro pelo Distrital de Saúde Glória Cruzeiro Cristal, mencionou a necessidade de acompanhar as diretrizes da gestão e do conselho, apontando distorções a serem corrigidas. Pires observou as longas filas no hospital e destacou que a situação da saúde não é como parece nas propagandas. Ele mencionou sua dificuldade em conseguir uma consulta com um dermatologista desde 2017. Além disso, Pires, que é uma Pessoa com Deficiência (PcD) e utiliza cadeiras de rodas, também alertou para o descumprimento do decreto nº 5.296 de 2 de dezembro de 2004. Ele relatou problemas de acessibilidades nos serviços de saúde e falta de salas apropriadas para atendimento para as PcDs.
A coordenadora adjunta do CMS, conselheira Rosa Helena Mendes, representante do Conselho Distrital de Saúde Partenon, questionou sobre o programa Agiliza. Ela apresentou a situação do usuário Elídio Antônio Brum Vianna, 72 anos, que aguarda por uma cirurgia de hérnia há 10 anos. Ela denunciou que na unidade de saúde foi constatado que no sistema Gercon (sistema para a marcação de consultas e exames da SMS) a cirurgia havia sido realizada mesmo não tendo sido feita. “A cirurgia não foi realizada e o senhor Elídio segue com o problema e dores”, destacou Rosa Helena que falou alertou sobre as dificuldades burocráticas e a falta de estatísticas confiáveis sobre essa situação.
Deliberações do Controle Social do SUS
Além de reprovar as Contas do Agiliza, o Conselho
deliberou que a gestão da SMS faça o detalhamento do utilizado para capacitação na Atenção Primária em Saúde (APS) e que foi apontado com estranhamento pela análise da Cofin.
O CMS também encaminhou que o gestor apresente a justificativa de usar R$14.796.084,00 do Programa para compras de equipamentos, sendo que existe a previsão de recursos para isso oriundos das emendas impositivas. Para a conselheira da região Leste e membro da Cofin, Ana Paula de Lima, a compra dos equipamentos poderia ter sido feita com recursos específicos já destinados para isso. “Não se trata de dizer se os equipamentos são necessários ou não, a questão é que existem outras fontes que podem ser usadas para isso”, destacou.