A cédula defasada

Cezar Busatto
 
Um jovem de menos de 30 anos subiu à tribuna no Teatro Dante Barone, na Assembléia Legislativa. Era a primeira manifestação na plenária temática Circulação, Transporte e Mobilidade Urbana do Orçamento Participativo (OP), em meados de abril. O rapaz inicia a intervenção com uma queixa: a cédula de votação de prioridades do encontro não prevê opção para quem deseja incentivar a mobilidade limpa na cidade – caminhar, pedalar ou qualquer outra forma de deslocamento impulsionada pela própria força de quem se movimenta. Assisti à manifestação com orgulho. Explico.
Orgulho em razão de a crítica ter sido feita por um jovem interessado em um dos problemas mais urgentes das metrópoles modernas – a questão da mobilidade, diretamente relacionada à humanização dos espaços públicos e à sustentabilidade. Orgulho por aquele jovem haver decidido compartilhar tal interesse justamente em um dos mais caros fóruns da democracia participativa de Porto Alegre e, sem nenhum exagero, do mundo todo – o nosso OP. Orgulho também pela pertinência da crítica: na tarde daquele mesmo dia, em reunião na Secretaria Municipal de Coordenação Política e Governança Local, havíamos percebido a defasagem da cédula. O jovem está certo: o que ali está oferecido deixa a desejar em relação a demandas que têm ganhado maior importância – maior segurança e possibilidade de deslocamento para pedestres, ciclistas, cadeirantes, skatistas, etc.
Dos quatro itens constantes na cédula, pelo menos dois deles atendem especificamente a necessidades resultantes do uso do automóvel – ou melhor, do uso cada vez mais irracional e descontrolado do carro. Em recente estudo, o Observatório da Cidade de Porto Alegre (ObservaPOA) apontou que, de 2001 a 2011, o aumento da frota de automotores na Capital gaúcha foi quase cinco vezes maior do que o crescimento da população. O problema, como sabemos, não se limita à nossa cidade. A busca por opções ao automóvel é uma constante em todas as regiões do mundo.
Mais do que uma crítica, a participação daquele jovem representa um reconhecimento e, ao mesmo tempo, um alerta – reconhecimento da capacidade do OP em traduzir em realidade aspirações da população; alerta sobre a necessária e constante renovação que deve caracterizar administrações públicas, o que inclui organismos da democracia participativa como o OP. Aquele jovem sonha com um mundo melhor, construído por meio da colaboração e da solidariedade da população. Aquele jovem quer uma cédula que lhe permita votar nos sonhos que nos inspiram.
 
Secretário Municipal de Coordenação Política e Governança Local
19/04/2012